sexta-feira, 3 de maio de 2013

Esquinas - Amor no Outono



Numa esquina da vida, um não viu o outro e se esbarraram. O senhor gentil abaixou-se rápido e pegou a bolsa que a senhora deixou cair:

_ Desculpe-me senhora, estava distraído, diz o senhor.
_ Também estava distraída e não o vi, desculpe-me, responde ela, a senhora.
_ Então para nos desculparmos, aceita um café? Diz o senhor.
_ Sim, vamos tomar um café, responde a senhora.

Bem na esquina em que se esbarraram, surgiu uma confeitaria que a vida criou para eles.

Sentaram-se em uma mesa e apresentaram-se:

_ Sou viúva depois de muitos anos de casamento. Avó de dois netos, filhos de um dos meus três filhos. Aposentada como arquiteta, mas ainda aceito alguns trabalhos particulares, conta a senhora.
_ Sou divorciado, também avô, mas de quatro netos presenteado pelos meus dois filhos. Com atividade profissional independente.

Não sei quantos cafés tomaram, sei que conversaram muito tempo. Um analisando o outro. Perceberam algumas igualdades entre eles. Despediram-se cordialmente, o senhor querendo pedir o telefone da senhora, a senhora também queria ser contatada, mas ambos se deram as mãos e partiram pela esquina.

Ela pensando nas conversas que tiveram e no que percebeu dele. Será que é isso mesmo? Perguntou-se. Sentira nele muita sensibilidade ao colocar suas opiniões sobre a vida. Lembra que ao enterrar o marido, pensou: Agora é que você se vai, que me liberta, e já não tenho mais tempo para pensar em encontrar um homem com quem possa dividir meus anseios, minha necessidade de sonhar e amar. Vai-se assim, me deixando só.

Sorri sonhadora, lembrando-se do senhor sensível. Precisa tornar a encontrá-lo.

Nos dias seguintes várias vezes ele surgiu em seus pensamentos e as conversas também. E resolveu. Iria procura-lo. Numa tarde, depois que entregou o projeto no qual trabalhava há dias, viu que o horário estava perfeito, foi ao Cine-Arte, local que ele disse frequentar. Comprou o ingresso e acomodou-se numa poltrona dos fundos. Pesquisou entre os poucos presentes e não o encontrou. Dois dias depois voltou, sentou-se outra vez na poltrona dos fundos e o viu. Trocou a poltrona dos fundos por outra na fileira atrás da que ele estava. Levantou-se junto com ele e saiu pelo mesmo lado que ele e à sua frente. Ao chegar à antessala do cinema virou-se e fingiu surpresa ao vê-lo:
_ Olá, como vai?
Pareceu que ele por instantes não a reconheceu, mas logo em seguida sorriu e respondeu:
_ Bem, e que prazer lhe encontrar!

Ela já havia se preparado para o encontro “casual”:

_ Pois é, estava com tempo livre, pois já terminei o projeto que estava trabalhando e resolvi assistir o filme. Bom te encontrar!
_ E você, como vai? Está com tempo livre? Ótimo, então está convidada para nos conhecermos mais um pouco, que acha?

Ficaram pelo shopping onde se localizava o cinema, viram vitrines, pesquisaram as novidades de uma livraria, ela até comprou um livro. Comentaram sobre o filme. Tomaram sorvete de morango com chocolate. Ele comprou meias e um botão de rosa para ela.

Conforme a conversa se desenvolvia, mais ele a atraia: Sim, encontrara o homem com que sonhara sempre e que se dizia não existir.

Ele a comparava com todas as mulheres que havia conhecido, ela é inteligente, sensível e bonita. Uma senhora bonita, não sabia sua idade, mas pelo que ela já havia contado imaginava, apesar de que pela aparência parecia ter menos. Sempre pensou que inteligência e beleza não fizessem par.

Combinaram de assistirem junto o novo filme do Cine-Arte na próxima semana.
Ela se foi avaliando-o e percebendo que as novidades que soube dele acrescentaram mais admiração. Agradeceu–se pelos cuidados com a saúde, o físico e a mente, que sempre dedicou a si mesma, talvez porque no íntimo tinha esperanças de um dia encontrar esse homem. Sentia uma sensação agradável ao relembrar que notou admiração nos olhos dele.

Três encontros depois, e cada um mais prazeroso que o outro, num carinhoso abraço de despedida, ela sentiu um frêmito de desejo que a surpreendeu! Quanto tempo essa sensação estava ausente de seu corpo! Ele também sentiu e ela percebeu. E pela esquina se foram.

Acho que vou ter que ajuda-lo a se desinibir, ela pensa enquanto se afasta. O senhor sensível se vai pensando que a senhora é muito discreta, muito elegante, muito dedicada à família e teme magoá-la se confessar seu desejo.

Ele a relembrava com ânsia de homem, sentia-se envolvido e agradecido. As mulheres que conhecera até aqui, inclusive e, principalmente a que foi sua mulher por muitos anos, sempre quiseram alguma coisa em troca do amor que lhe davam. Sua estabilidade financeira é que as atraiam e nela, na senhora bonita, ele sente que é admirado pelo que é. O interesse dela é somente seus sentimentos, suas emoções, suas opiniões e seu modo de ver a vida. Nenhuma pergunta sobre o que ele tem ou deixa de ter.

Nesse encontro ela sugeriu um restaurante com música suave e pista de dança, ele gostou da sugestão. O ambiente era agradável, decoração discreta em madeira, meia luz que junto com a música criava um ambiente agradável. Pediram vinho tinto, escolhido e aprovado por ele. Um frente ao outro, olhares que nada viam a não ser um ao outro. Outras pessoas no restaurante, mas eles não percebiam, o garçom talvez notando não apresentou logo o menu. Ele convidou-a a dançar. Alguns notaram o enlevo do casal já não jovem e até gostaram de disfarçadamente os observarem. Jantaram nem sabem o que. Na hora da despedida, ela convidou-o a subir ao seu apartamento.

Ao entrarem e assim que ela fechou a porta e por instantes ficaram parados mudos comunicando-se pelo olhar. E como por força de uma atração magnética o beijo apaixonado aconteceu. Soltaram a emoção represada com ânsia, com carinho, com desejo. Amaram-se como se fossem parceiros de tempos distantes. Descobriram-se um no outro, identificação plena e agradeceram à esquina da vida que os apresentou.





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