Sala de espera de consultório dentário. Existe local pior? Acho
que é a antessala do inferno! Você fica lá ouvindo os sons horripilantes que
vem de trás da porta que fecha a sala de tortura. E porque o doutor cirurgião
dentista gosta de conversar enquanto está com dedos e trecos na nossa boca,
você sabe? Já desenvolvi uma linguagem própria pra essas ocasiões: arregalo os
olhos pra dizer, sim tem razão, ou concordo! Fecho quando respondo não. Mas ele nem percebe
e nem espera resposta, quer mesmo é ficar falando, será que imagina que vou esquecer
de sentir as picadas da anestesia, ou o incomodo daquele motor espirrando água
no rosto, nos cabelos, nos braços e na minha roupa?
Resolvo pegar uma revista. Procuro entre catálogos de remédios e
de equipamentos dentários, encontro uma, pelo menos é de negócios, nada a ver
com as torturas que me aguardam. Também nada a ver com meus interesses, mas o
jeito é folheá-la.
Balancete anual de alguma empresa, interessantíssimo! Mas tem
uns números, será que entendo? Despesas, custos, débitos, créditos, passivos,
ativos... Recostei a cabeça na poltrona e fiquei imaginando onde tenho crédito
e debito além da minha conta bancária... Como estará meu balancete no
céu, pensei. Sim, porque naquela antessala é o pensamento mais apropriado, vai
que não suporto a tortura e meu coração para! A porta é aberta e o carrasco
sorridente e o pior, o danado é bonito com aquele “sorrisão branco” e me diz:
_ Bom dia, Hilda, pode entrar, é sua vez!
Parece que está me convidando para uma sessão de algum tipo de
prazer. Nem sinto os passos que dou até a cadeira de sofrimentos.
_ Vou ter que fazer o canal do pré-molar, diz o sádico.
Começo sentir suor e ao mesmo tempo frio, e lá vem ele sorrindo
escondendo aquela enorme seringa. Penso no meu balancete do céu e dedico o
sacrifício para diminuir meu débito. Fala e fala e sorri, acho sabe que seu
sorriso me distrai, enquanto espera o efeito da anestesia na minha boca.
_ Vou abrir o canal, mas fique tranquila, não vai doer nada!
Esqueço meu balancete celestial e penso que vou lhe dar um chute,
daqueles que aprendi num curso de autodefesa, aí... Lembro que se fizer isso,
sei lá como vou arranjar créditos para zerar o tamanho do meu débito com o céu.
E mete brocas no meu dente e troca broca, e troca broca, automaticamente minha
perna levanta-se em direção ao seu ponto fraco, mas consigo dominá-la em tempo.
Acho que ele percebe o perigo iminente e diz:
_Pronto, agora vou colocar um curativo e acabou por hoje.
Acabada a sessão torturante, me acompanha até a porta, tento
retribuir seu sorriso lindo ao me despedir e percebo que um lado da minha boca
está paralisada, imagino que no lugar de sorrir fiz uma careta feia, me irrito
mais um pouco, ganho mais créditos, e consigo dizer:
_ Até logo, obrigada!
Acho que diminui bem meu débito com o céu, você concorda?
Olá, sou um Contador e não sou tão chato como todos pensam que os Contadores são. Digitei "sogra é débito" e apareceu o seu artigo. Gostei. Vou visitar essa página a partir de agora. Abs.
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